LER É UM PRAZER
A ARTE DE SER FELIZ
Houve
um tempo que a janela se abria sobre uma cidade que parecia feita de giz, perto
da janela havia um pequeno jardim quase seco. Era numa época de estiagem, de
terra esfarelada, e o jardim parecia morto. Mas todas as manhãs vinha um podre
homem com um balde, e em silêncio, atirando com a mão umas gotas de água sobre
as plantas! Não era uma regra: era uma espécie de aspersão ritual, para que o
jardim não morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas
de água que caíam de seus dedos magros, e meu coração ficava completamente
feliz.
Às
vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor: Outras vezes encontro
nuvens espessas.
Avisto
crianças que vão para a escola, pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e
fecham os olhos, sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como
refletidas no espelho do ar. Maribondos que sempre me parecem personagens de
Lope de Veja. Às vezes, um galo canta. Às vezes, um avião passa, Tudo está certo,
no seu lugar, cumprindo o seu destino. É eu me sinto completamente feliz.
Mas,
quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada
janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante
das minhas janelas, e outros, finalmente, que preciso aprender a olhar, para
poder vê-las assim.
(Cecília
Meireles. Escolha o seu sonho. 3. ed. Rio de Janeiro: Recorda. 1968. P. 25.)
Nenhum comentário:
Postar um comentário